Olhos atentos que definem as oportunidades do futuro
Publicado na Gazeta do Povo, em 25/07/2008
A função do coolhunter é, como o nome indica, “caçar tendências”. Observador por natureza (e por contrato), esse profissional presta atenção no comportamento de diferentes grupos, em vários países, e ajuda as empresas a definirem o que será objeto de desejo nos próximos anos
Aos pés do Empire State Building, no coração de Nova Iorque, as atenções de Vicente Frare não estão voltadas para a grandiosidade do prédio, mas para as pessoas que passam por lá – como elas se vestem, o que comem, sobre o que conversam e o que chama a atenção delas. Ele quer saber o que está nas vitrines, nos comerciais, nos jornais e o que é servido nas lanchonetes. Ossos do ofício de um coolhunter – em uma tradução livre, algo como um “caçador de tendências”.
Inquietação deu origem à agência.
A Pulp Comunicação surgiu de uma “inquietação”. Ou melhor, três. Amigos de infância, Patrícia Papp, Fernanda Ávila e Vicente Frare contam que tinham, cada um em sua área de atuação, muita vontade de fazer algo diferente. Há um ano e meio a vontade deu origem à agência de conteúdo e tendências. “Eu tinha uma insatisfação grande. E uma certeza de que as coisas poderiam ser feitas de uma maneira diferente e melhor”, lembra Patrícia, que é formada em publicidade. “Percebemos as mudanças no mundo da comunicação.”A empresa oferece hoje serviços de criação e conteúdo, baseados nas ferramentas do seu próprio trabalho de “investigação” de tendências. Além disso, quinzenalmente produz o Pulp Salsa, um boletim com alguns resultados dessas buscas e enviado para os clientes – na sua grande maioria, agências de publicidade. “É um boletim de tendências e inspirações”, define Fernanda. A assinatura semanal do boletim custa R$ 2 mil. A idéia é reunir informações “inspiradoras” e, principalmente, que gerem negócios. “Reunimos idéias, coisas interessantes que estão acontecendo no mundo e que podem se transformar em algo palpável”, explica a jornalista. (CS)
O trabalho dele – a busca pelo que é tendência – ainda é relativamente novo no Brasil, mas aos poucos vai ganhando importância como ferramenta do trabalho de publicitários e profissionais de marketing, assim como já acontece na Europa e nos Estados Unidos. “Observamos como as pessoas falam, o que consomem, o que vestem e também como elas vivem. Viajamos não como turistas. Mas para viver, sentir a experiência de quem vive naquele local”, diz Frare, que é um dos sócios da Pulp Comunicação – agência curitibana de tendências criada há um ano e meio. “Não se trata de prever. Nosso trabalho é mostrar o que está em voga no mundo todo e que vai chegar também ao Brasil”, define Fernanda Ávila, também sócia da empresa.Ser observador é, portanto, indispensável. Mas não basta. “Existe um embasamento teórico muito forte no trabalho, com base na semiótica”, explica a coolhunter Carol Garcia, que trabalha na área há cerca de dez anos. “Além disso, para um trabalho como esse, a compreensão da cultura local é fundamental.” Carol é professora de um curso da área no Senac São Paulo – o primeiro do país e, até hoje, um dos únicos. Ela mora hoje no Brasil, mas faz viagens periódicas pela América Latina. A sua empresa, a Modus, tem contrato com uma companhia norte-americana, cujo nome ela não divulga por força de contrato, para “bisbilhotar” o Brasil e outros países latino-americanos. “Vou sempre para Nova Iorque, mas o interesse deles é justamente que eu fique aqui.”
Observadores
Para garantir esse conhecimento da cultura dos mais diferentes locais, a americana Trendwatching, uma das principais agências de tendências do mundo, mantém uma equipe de 8 mil “observadores”, que monitoram o comportamento dos consumidores nos EUA e em pelo menos outros 50 países, entre eles o Brasil. O conteúdo produzido é vendido para profissionais de 12 países. “Nosso foco está em ‘insights’ sobre consumidores e tendências de comportamento, e conseqüentemente, as oportunidades de marketing e negócios que elas representam”, diz a agência, em seu site. Mas explica: você não vai encontrar o “tamanho ideal para saias no verão de 2010” nem dicas do tipo: “o vermelho é o novo preto”.Na lista de clientes da Trendwatching estão nomes como Google, Apple, Natura, Kraft Foods e Disney. As informações das agências de tendências já fazem parte dos estudos de marketing destas e de várias outras grandes empresas, brasileiras inclusive. Achar quem fale sobre isso, no entanto, não é tarefa das mais fáceis. Como são consideradas estratégicas, as informações são guardadas a sete chaves.A fabricantes de perfumes e cosméticos O Boticário usa o serviço das grandes agências mundiais, como a WGSN, e tem uma equipe própria de coolhunters – que fazem viagens periódicas para Europa e EUA, principalmente. Além disso, a empresa mantém consultores específicos para algumas categorias, como maquiagem e produtos masculinos, e faz pesquisas olfativas no exterior. Mas isso é só o que se pode saber sobre o uso das tendências do lado de fora das paredes da fábrica.
WGSN
Com 3 mil assinantes de 80 países, a londrina WGSN (sigla para Worth Global Style Network) é considerada a maior agência de tendências do mundo. Seu banco de dados – atualizado diariamente no site www.wgsn.com – é construído por uma equipe de 200 pessoas na Inglaterra, além de uma série de colaboradores espalhados pelo mundo. “O trabalho dessas pessoas é acompanhar tudo que há de novo, não só na moda. Elas conversam com designers, empreendedores, gente que está criando algo diferente”, explica a diretora da WGSN para a América do Sul, Andréa Bisker.No Brasil, a agência tem 120 clientes. A maior parte, diz Andréa, são empresas da área de moda. “Mas também há muita gente de outros mercados interessados em ler nosso conteúdo. São profissionais de desenvolvimento de produto, de marketing e agências de publicidade.”A assinatura do serviço custa US$ 27 mil dólares anuais – e dá direito a cinco senhas. Segundo a empresa, 30 mil usuários navegam diariamente no site em busca de informação. Além da atualização diária, duas vezes por ano os profissionais da agência se reúnem em Londres. “Juntando as informações de diversos lugares, eles desenham três ou quatro grandes movimentos importantes, que vão influenciar o desenvolvimento de produtos. São as macro tendências.”